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Intervenção do BE nas comemorações do 25 de Abril em Alverca e Sobralinho

Este foi o conteúdo da intervenção de João Fernandes, representante do Bloco de Esquerda na freguesia de Alverca do Ribatejo e Sobralinho, nas comemorações dos 43 anos da Revolução dos Cravos:

Muito boa noite a todos,

Celebramos hoje, e celebraremos amanhã, uma vez mais, como todos os anos, a Revolução dos Cravos. É difícil imaginar como seria hoje o nosso país sem esse momento fundador de novos tempos, de novas esperanças e de tantas conquistas como foi o 25 de Abril de 74. É difícil olhar à nossa volta e não ver tudo o que mudou, tudo o que foi conquistado, tudo o que foi dado às pessoas. É difícil pensarmos em decisão popular, na possibilidade de nos reunirmos, de falarmos sem medos, de expressarmos as nossas opiniões, de perseguir os nossos sonhos ou na possibilidade, sequer, de esperar um trabalho com dignidade, com condições, sem recordarmos persistentemente a data que hoje celebramos.

Aqueles que, naquela manhã, marcharam para Lisboa para fazer a revolução sabiam que, para se fazer o país com que o povo sonhava, tudo estava ainda por fazer. Marcharam para pôr fim ao “estado a que chegámos”, e marcharam conscientes de que tudo ainda estava por fazer. E muito foi feito desde então. Sobre isso, ninguém aqui presente tem dúvidas. O 25 de Abril abriu portas ao progresso social, ao progresso económico, ao progresso cultural, ao progresso na instrução. O povo português tornou-se soberano dos seus destinos, fez-se uma democracia avançada e a Constituição da República tem funcionado, ao longo destes quarenta anos, como uma poderosa garantia contra as mais graves tentativas de recuos às liberdades e possibilidades conquistadas com o 25 de Abril.

No entanto, honrar a Revolução de 74 tem de passar por muito mais do que recordar tudo o que alcançámos de positivo ao longo das últimas décadas. Celebrar o 25 de Abril tem de corresponder a muito mais do que a uma celebração dos valores que inspiraram os feitores da nossa democracia e que continuam a inspirar-nos a nós.

No dia das primeiras eleições do Portugal Democrático, em 1975, apenas 8,5% dos portugueses se privaram do seu direito de voto. Em 2015, mais de 44% dos portugueses optaram por não exercer o seu direito de voto. Devido às mudanças recentes no funcionamento do sistema político e partidário português, em 2016 registou-se um grande aumento da confiança dos portugueses nas suas instituições políticas (um aumento bem acima do resto da Europa). Contudo, em 2014, apenas 26% dos portugueses confiavam nas instituições políticas do país. Em todo o Mundo, o país em que mais cidadãos confiam nas suas instituições (a Dinamarca, onde 91% das pessoas confiam no modo como funciona a sua democracia) é também o país onde as pessoas se assumem mais felizes. Não é por acaso. Só podemos ser felizes se confiarmos, juntos, no modo como convivemos, como alcançamos decisões que nos afetam a todos, quando sentimos que somos devidamente representados e que, quem nos representa, trabalha de acordo com a esperança que neles depositámos.

Apesar do muito que foi feito, há sem dúvida muito a fazer. Mais de quarenta anos após o dia em que nasceu a nossa democracia, é necessário aprofundar mais a democracia em que vivemos. Só com uma democracia mais profunda, mais próxima dos cidadãos, poderemos consolidar uma democracia em que mais portugueses confiem. Se queremos viver melhor e tomar decisões que nos façam melhor, temos de construir uma democracia mais justa, mais aberta, mais inclusiva. De hoje em diante, para fazermos um país melhor, é necessário ouvir mais, respeitar mais, pedir mais vezes a opinião. Em nome dos valores de Abril e das conquistas de Abril, a nossa democracia tem de se tornar mais participativa.

E é no poder local que a democracia mais pode florescer, abrir-se, tornar-se mais acolhedora, onde podemos recuperar mais instrumentos de democracia direta. Precisamos de evoluir para uma democracia em que sejam as próprias pessoas a decidir o que querem para os seus bairros, que equipamentos, que calçada, que mobiliário, que ocupação do espaço público, que eventos. O processo de consulta aos cidadãos tem, de uma vez por todas, de começar antes de estarem já feitos os projetos. Temos de construir uma democracia em que as pessoas sejam ouvidas antes de se decidir por elas. Apenas então, apenas quando construirmos uma sociedade em que a participação popular, a consulta e a decisão do povo forem absolutamente centrais, apenas então teremos, finalmente, o país de Abril por que tanto se lutou.

O poder local democrático foi uma das mais relevantes e simbólicas conquistas do 25 de Abril de 74. Cabe-nos a nós, hoje, conquistar mais democracia, muito mais democracia para o poder local.

Terminarei este discurso, mas não sem antes recordar o magnífico cidadão e combatente que foi o capitão Fernando José Salgueiro Maia. Salgueiro Maia deixou-nos há precisamente 25 anos, mas não o fez sem antes nos dizer o mais essencial de tudo:

“Não se preocupem com o local onde sepultar o meu corpo. Preocupem-se é com aqueles que querem sepultar o que ajudei a construir.”

25 de Abril sempre!

 

Alverca do Ribatejo e Sobralinho, 24 de Abril de 2017