Share |

Comunicado – Em defesa do Serviço Nacional de Saúde

O direito à proteção da saúde de qualquer cidadão está previsto na Constituição da República Portuguesa, artigo nº 64, que estabelece que através do Serviço Nacional de Saúde (SNS) universal, geral e tendencialmente gratuito ninguém poderá ver limitado o seu acesso a cuidados de saúde adequados. Se dúvidas existiam sobre a importância da garantia deste direito, os últimos dois anos, dominados por uma pandemia inesperada, mostraram como um serviço de saúde público é fundamental na gestão da saúde pública do nosso país e essencial para que ninguém seja excluído da equação.

Infelizmente, ao longo dos últimos anos, temos assistido a um desinvestimento nas medidas que reforçam as capacidades e organização do SNS. Tal tem levado a um descontentamento crescente dos profissionais de saúde mas também a uma descredibilização do SNS, que se torna benéfica apenas para todos os que fazem da saúde um negócio. Este foi um dos pontos cruciais na base dos argumentos para os consecutivos chumbos pelo Bloco de Esquerda aos orçamentos apresentados pelo governo do Partido Socialista, que deram origem às eleições de Janeiro de 2022 e ofereceram ao PS a maioria absoluta.

As consequências deste desinvestimento são hoje inegáveis e sentidas por qualquer um. Perante a deterioração das condições de trabalho no setor público, os profissionais de saúde são tentados à emigração ou ao setor privado, acelerando a desigualdade de acesso à saúde e enfatizando a necessidade de o Estado pagar aos privados para o exercício de direitos fundamentais da população, com custos mais elevados e apesar de toda a infraestrutura instalada. Hoje, quase metade do Orçamento do Ministério da Saúde se dirige ao negócio privado, devido a uma escolha política de desinvestimento.

Se é verdade que nos últimos anos sempre estivemos atentos, denunciando e participando em soluções em relação às falhas sentidas pelos cidadãos do concelho de Vila Franca de Xira nos seus diversos centros de saúde, hoje chegámos a uma situação insustentável.

Das 9 unidades destinadas a cuidados de saúde familiar, 2 delas (Alhandra e Forte da Casa) ficaram sem qualquer médico de medicina geral e familiar a prestar os cuidados de saúde primários destinados a esta população. Ou seja, apenas considerando a situação limite destas duas unidades, 24.071 pessoas estão neste momento sem médico de família. Contudo, a situação noutras unidades prevê que a gravidade se alastre pelo restante concelho: a UCSP da Póvoa tem 72% dos utentes sem médico de família (cerca de 13.000 utentes) e a USF do Bom Sucesso 49% (cerca de 3.400 utentes) (dados de Dezembro de 2022, portal SNS BI-CSP).

Os cuidados de saúde primários, onde se incluem as USF e UCSP que normalmente reconhecemos como centros de saúde, são a porta de entrada no SNS. Estes funcionam como uma das principais bases do sistema de saúde defendido atualmente pela Organização Mundial de Saúde e vigente também no nosso país. Refletem, ou deveriam refletir, a articulação entre justiça, equidade social e o reconhecimento do direito fundamental ao nível mais elevado possível de saúde vigente no Artigo 25.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem: “ Todas as pessoas têm direito a um nível de vida adequado à sua saúde e bem-estar próprios e da sua família, incluindo alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e serviços sociais necessários”. É, então, nos centros de saúde que deve estar assegurado o acesso a cuidados de saúde completos, desde a promoção, prevenção e tratamento à reabilitação e cuidados paliativos, sempre tão perto quanto possível do ambiente comunitário e familiar de cada cidadão.

Neste momento, a inacessibilidade ou a elevada desigualdade de acesso a estes serviços é a realidade de uma parte significativa dos cidadãos do concelho de Vila Franca de Xira. Por escassez de recursos, nunca foi possível a todas as unidades cumprir a totalidade das funções previstas. As medidas que hoje a ARS e o ACES nos apresentam para solucionar o problema são medidas a curto-prazo que não asseguram a visão pretendida para os cuidados de saúde primários.

A Coordenadora Concelhia do Bloco de Esquerda de Vila Franca de Xira e todos os eleitos pelo Bloco de Esquerda presentes nos diversos órgãos autárquicos estarão do lado da luta que defende um SNS para todos e todas: universal, geral e gratuito. Um SNS que não ceda aos lóbis do negócio privado da saúde. Um SNS que reconheça os seus profissionais de saúde e valorize as suas condições de trabalho e as suas carreiras. Um SNS com uma gestão transparente e eficiente.

Manteremos a nossa ação reunindo com as organizações e entidades competentes na área da saúde, mantendo contacto com a nossa bancada parlamentar questionando o governo no Parlamento, estando ao lado dos utentes e das suas organizações.

Uma democracia saudável só é possível com um SNS saudável.

 

A Coordenadora Concelhia do Bloco de Esquerda de Vila Franca de Xira

17 de janeiro de 2023