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Queremos mais e melhor ferrovia, mas não assim!

A apresentação pública da proposta

No último trimestre de 2022, quando a divulgação do Plano Ferroviário Nacional revelou que o concelho de Vila Franca de Xira sentiria o impacto de diversas intervenções previstas, o Bloco de Esquerda propôs imediatamente a discussão do tema no âmbito de uma sessão extraordinária da Assembleia Municipal, dando espaço aos devidos esclarecimentos por parte das Infraestruturas de Portugal e dando ocasião à pronúncia por parte da população.

Já em 2023, foi conhecida a intenção de alargamento da Linha do Norte para quatro vias no troço compreendido entre Alverca e Castanheira do Ribatejo, conforme proposta apresentada por técnicos das Infraestruturas de Portugal em reunião extraordinária de Câmara Municipal, a 5 de maio, e em sessão extraordinária da Assembleia Municipal, a 27 de junho. Essa intervenção no concelho de Vila Franca de Xira, que se enquadra numa estratégia de requalificação e modernização da Linha do Norte e, simultaneamente, de criação de uma ligação de alta velocidade utilizando o mesmo canal, promete impactos significativos na paisagem urbana, na vivência quotidiana, no uso dos espaços e, de uma forma geral, na qualidade de vida de alhandrenses e vilafranquenses.

 

Os impactos que se conhecem

Na vila de Alhandra, o alargamento da linha férrea para Nascente arrasará com aproximadamente metade da largura da Avenida Afonso de Albuquerque, requerendo o abate de todo o arvoredo aí existente (que, presentemente, constitui uma barreira ao ruído e ao impacto visual das três serventias que atravessam a vila – o caminho de ferro, a EN10 e a Auto-estrada do Norte) e colocando a passagem dos comboios a poucos metros das casas e da Escola Básica n.º 2 de Alhandra, além de estar prevista a deslocação para Sul da estação e a destruição do bairro da CIMPOR, cuja classificação e requalificação foram já alvo de proposta por parte do Bloco de Esquerda. Em Vila Franca de Xira, a proposta compromete uma área significativa da principal área de lazer da cidade – o Jardim Constantino Palha – e reduzirá a cerca de metade o edificado no Cais de Vila Franca, prejudicando a ligação da população ao rio Tejo.

Tais impactos têm motivado a indignação e a mobilização da sociedade civil, de forma individual ou organizada. O Bloco de Esquerda partilha do sentimento geral da população, recusando-se a aceitar que uma intervenção desta importância e com estas consequências seja apresentada sem que se conheçam todos os estudos que sustentam a viabilidade desta proposta e a rejeição de outras soluções.

 

Exigimos conhecer todos os estudos que sustentam a proposta             

O Bloco de Esquerda reivindica a total transparência deste processo de decisão. Consideramos inaceitável que uma proposta chegue a este estágio antes da auscultação da população ou dos seus representantes nas autarquias locais. Associamo-nos a todas as vozes que reclamam mais e melhor ferrovia no país e no concelho de Vila Franca de Xira, mas não a todo o custo ou sem o estudo de soluções que prejudiquem menos as populações locais.

A necessidade de um forte investimento no transporte ferroviário tem sido protagonista dos discursos do Bloco de Esquerda desde a sua formação. Fomos sempre firmes na denúncia de que a ferrovia sofria um desinvestimento e um abandono que comprometiam a coesão nacional e a descarbonização da economia. Nas últimas eleições legislativas, o Bloco de Esquerda apresentou-se com um programa que defendia o reforço e a extensão da rede ferroviária nacional nos territórios deficitários de transporte ferroviário, a correção de assimetrias territoriais, a total eletrificação e gestão da rede com recurso a sistemas automatizados de sinalização, controlo e gestão de tráfego, assumindo o objetivo de elevar o peso da quota ferroviária no transporte terrestre de pessoas e mercadorias a 40% até 2040.

A viabilidade do transporte ferroviário em Portugal pressupõe a densificação da sua rede, servindo mais populações e cobrindo mais territórios. O encerramento de linhas e a perda de competitividade de outras (como a linha do Oeste) conduziram à situação presente em que a Linha do Norte se apresenta como o canal estruturante de toda a rede ferroviária nacional, sem alternativa na ligação entre Lisboa e as regiões Centro e Norte. É esse cenário de absoluta centralidade da Linha do Norte que pressiona à decisão de colocar neste traçado todos os serviços de transporte ferroviário.

 

O Bloco de Esquerda questionou o Ministério das Infraestruturas

Perante a reduzida informação que foi disponibilizada à população e aos autarcas, o grupo parlamentar do Bloco de Esquerda dirigiu ao Governo, no dia 15 de setembro, um requerimento em que solicitou os estudos que fundamentam a opção apresentada pelas Infraestruturas de Portugal e o estudo de alternativas que tenham sido consideradas em comparação com a opção apresentada.

A resposta foi endereçada aos deputados bloquistas a 18 de outubro, anexando a mesma apresentação de diapositivos já apresentada em Assembleia Municipal e referindo que “oportunamente” a divulgação dos estudos será realizada, bem como a avaliação de impacte ambiental, prevendo-se o escrutínio por parte da comunidade.

O requerimento e a respetiva resposta ministerial podem ser conhecidos aqui.

Estes termos confirmam que o Governo não tenciona auscultar a população e os autarcas na fase de elaboração do projeto ou de seleção de cenários a estudar, mas somente quando a decisão sobre a solução a implementar já estiver tomada. Da mesma forma, e por tempo indeterminado, a informação já existente permanecerá inacessível aos interessados, alimentando legítimos receios e um sentimento de desconfiança na comunidade.

O país necessita uma infraestrutura ferroviária e um serviço de transporte ferroviário que garantam a coesão territorial e o direito das populações à mobilidade, servindo os interesses da economia nacional. A Área Metropolitana de Lisboa e o concelho de Vila Franca de Xira necessitam comboios que assegurem o direito à cidade e a resposta aos fluxos e ritmos do dia-a-dia. Necessitamos mais comboios, mais acessíveis, mais confortáveis e mais regulares.

Contudo, não aceitamos que, com o argumento de que haverá mais comboios a servir o concelho (promessa, aliás, com que a CP nunca se comprometeu), a modernização da Linha do Norte avance sem o confronto de propostas alternativas, sem o diálogo com as populações e sem a completa transparência do processo decisório. Não aceitamos que Alhandra e Vila Franca de Xira sejam descaracterizadas para que o país continue a ignorar a necessidade de densificação da rede ferroviária, de otimização da infraestrutura existente e de avaliação, com rigor e transparência, das soluções possíveis.

 

A passagem de nível de Vila Franca: um problema a resolver

Falar da relação da cidade de Vila Franca de Xira com a ferrovia e da sua ligação ao cais é, também, recordar que centenas de vilafranquenses atravessam diariamente uma das passagens de nível mais perigosas do país. A passagem de nível do centro de Vila Franca de Xira vitimou dezenas de pessoas na última década e constitui um problema real de segurança. Reiteramos a nossa posição de que a passagem de nível deve ser encerrada, devendo ser estudadas formas de atravessamento pedonal da via-férrea que assegurem a acessibilidade a todas as pessoas. Defendemos igualmente que a área ribeirinha da cidade deve ser vedada ao trânsito automóvel, prevendo unicamente o acesso a veículos de emergência ou viaturas autorizadas que acedam através do viaduto a norte da cidade.

No nosso entendimento, a solução para este problema de segurança deve ser autonomizada da discussão sobre a modernização da Linha do Norte. O encerramento da passagem de nível deve acontecer independentemente do projeto final para modernização da linha férrea.