Este foi o conteúdo da intervenção de Rui Perdigão, eleito do Bloco de Esquerda na freguesia de Alhandra, São João dos Montes e Calhandriz, nas comemorações dos 42 anos da Revolução dos Cravos:
Boa noite.
Celebramos mais um ano de liberdade, em liberdades política, de reunião, de expressão, e outras mais que o regime ditatorial anterior a 1974 permitiu jamais. Comemoramos prestes o 42.º aniversário da Revolução de Abril.
Serão de todos sabidas as privações, os crimes e as aleatórias prisões ocorridas durante quarenta e oito anos de despotismo, culminando numa larga e trágica guerra colonial, cujos capitães lideraram com forte apoio social o movimento das forças armadas que pôs termo ao período de ditadura. Ainda que os anos imediatos foram política e socialmente conturbados, o regime democrático foi estabelecido e todos direitos e liberdades dos cidadãos fixados na Constituição da República Portuguesa deliberada pela Assembleia Constituinte eleita nas primeiras eleições gerais livres, e faz amanhã quatro décadas.
Tem sido nestes quarenta anos a Constituição o referente do exercício político e o garante da estabilidade nacional e o último amparo dos cidadãos nos momentos mais frágeis do país, quer os protegendo de danosas intenções de governos, quer de ingerências externas. E por isso mesmo tem havido de várias proveniências ataques à Constituição, visando enfraquecer nela direitos e liberdades e defesas dos cidadãos e torná-la subalterna de interesses económicos e financeiros. Mas cabe a todos nós defendê-la destas investidas.
O 25 de Abril cumpriu a sua principal função: acabar com a ditadura e fundar a democracia. Mas apesar de vivermos em regime democrático, não o havemos por perfeito, - e muito porventura nunca venha a ser, porque nós homens não somos perfeitos, - não obstante podemos e devemos, sociedade civil e partidos políticos, tentar melhorar a qualidade da nossa democracia continuamente, que é uma missão sem fim. E na prossecução deste desígnio comum, como recente exemplo, o Bloco de Esquerda propôs reduzir de 35 mil para 4 mil as assinaturas necessárias para se apresentar iniciativas legislativas na Assembleia da República, e no próximo dia 6 de Maio será discutida na Assembleia uma petição que pede a simplificação dos requisitos legais para a apresentação de iniciativas legislativas de cidadãos e de iniciativas populares de referendo; e sobre o regime destas últimas se está preparando alterações para reduzir bastante o número de assinaturas necessárias e desburocratizar o processo. Por conseguinte em breve os cidadãos terão facilitada a entrada de suas iniciativas no Parlamento e este órgão um pouco mais permeável à participação democrática.
Todavia a democracia nunca está absolutamente garantida e é tão frágil e perecível quanto os cravos que havemos hoje ao peito se não for estimada. A democracia, devido ao escrutínio e sufrágio que impõe, é obstáculo ao saque dos recursos financeiros dos estados e à expropriação das riquezas dos povos para benefício e cúmulo de ganância de entidades terrenas mas obscuras e intangíveis. Apenas no grau mais elevado da democracia conseguimos haver a sociedade mais justa e mais justa a distribuição da riqueza. Porém, as nefastas entidades financeiras dominantes persistente e sistematicamente intentam manipular a democracia, quando não a vergar ou derrubar, através do uso de governos-fantoche, de coacções, de fomento de golpes de estado e de guerras, para se assenhorearem ilegitimamente dos recursos da humanidade. O poder financeiro não quer subordinar-se ao poder político legítimo e democrático; e aquele usa a desmesurada riqueza e o controlo de recursos já acumulados para dominar a democracia e insaciavelmente acumular mais riqueza e recursos. O poder financeiro consegue estar fora do alcance das leis dos estados, mas consegue dos estados fazer as leis. E é assim que 1/10 da riqueza mundial circula ocultamente por offshores; e os 62 mais ricos têm metade da riqueza mundial, e a riqueza desses 62 aumentou 44 % desde 2010; os bancos foram salvos e os agiotas mais engordados; e com todo o dinheiro que escapa da fiscalidade do estado se privatiza monopólios e sectores estratégicos dos estados e acrescenta desigualdades; e é assim que se controla por fim os estados e bota mor parte do mundo na pobreza e explorado, e obediente sem pão na mesa. E é por isto e muito mais que devemos ser firmes e intransigentes na defesa e consolidação da democracia.
O 25 de Abril de 1974 libertou-nos de uma ditadura de vocação fascista, mas a democracia subsequente corre risco de derruir-se sob uma ditadura de índole financeira. Não se pode trocar o projecto de Abril, de realização de democracia política, económica, social e cultural, pela teologia de um mercado desregulado e fora do alcance da lei, ao serviço de uma minoria predadora da riqueza nacional e assente no negócio especulativo e em perpétuas rendas do estado, cujos efeitos são o agravamento das desigualdades sociais, aumento do desemprego, da pobreza e injustiças sociais, deterioração dos direitos à educação, saúde e segurança social. Além da ditadura, foi também contra estes efeitos perniciosos que se fez o 25 de Abril e porque seus valores continuam vigentes devem estar presentes na nossa contínua luta pela democracia, liberdade e cidadania.
Viva a Democracia!Viva o 25 de Abril!